Há tempo escrevi sobre a prática humana de prender pessoas em gaiolas mentais, provenientes do fato de formarmos conceitos rígidos sobre alguém e acabarmos por aprisionar o outro naquela imagem, naquele conceito. Ver o item Gaiolas, neste Blog.
Alguns leitores reclamaram, com razão, sobre um ponto que eu havia desconsiderado: o argumento de que uma pessoa não pode aprisionar a outra, se ela assim não o permitir. Logo eu, partidário da Teoria da Escolha, tive que ouvir isso... Bem feito para mim. Assim evito ficar muito vaidoso com o que eu penso e escrevo.
Acontece que outro dia, pensando ainda sobre o tema, observei como funciona a gaiola.
Na minha opinião é assim:
Tomemos o exemplo de um pai que tem um conceito negativo sobre um filho, que ele acha incompetente para amadurecer e ter uma vida profissional satisfatória. É provável que esse pai aja da seguinte maneira:
Toda vez que o filho erra ele confirma seu conceito verbalmente:
– Viu só, é o que eu digo, esse menino não acerta uma, não vai ser nada na vida! Não esperava outra coisa dele. Ele é assim mesmo, um fracasso.
Quando o menino acerta – e ele se esforça muito para acertar, para sair da gaiola, para agradar ao pai – recebe como resposta um silêncio desconfiado, quando não a descrença explícita:
– Desta vez ele até que acertou, mas deve ser por acaso. Esse acerto não vai ter continuidade. Ele não tem mesmo futuro, coitadinho. É até um bom menino, esforçado, estudioso, correto, mas não tem iniciativa e não é muito inteligente, como os irmãos.
A gaiola passa a funcionar quando o menino começa a perceber que seus esforços não são recompensados com o reconhecimento da família. O meio ambiente desfavorável é independente de seus esforços pessoais e de sua própria competência, não está sob o seu controle. Quando não consegue agradar aos que mais ama, o que ele pode esperar de desconhecidos? Cansado, ele desiste de melhorar a sua imagem e tentar acertar. E a profecia do pai se auto-realiza. O menino passa a preferir ser prisioneiro do conceito paterno, usado então como justificativa para a sua própria falta de vontade e medo de ficar tentando inutilmente superar a imagem negativa. Passa a ser mais cômodo corroborar o que a família pensa sobre ele.
A chave da gaiola parece ter dois lados. Um é construído pelos mais chegados, quando escolhem elogiar ou criticar, criando um ambiente favorável ou desfavorável. O elogio ajuda a libertar, abre a porta da gaiola. A crítica ajuda a aprisionar. O outro lado é construído pela própria pessoa, quando se rebela contra a crítica ou aprende com ela e quando aprende também a aceitar os elogios.
Se tiver sede de liberdade, o menino irá tomar em suas mãos as rédeas da sua própria existência, usará os elogios e as críticas parcimoniosamente e aprenderá a voar para longe do ninho, onde construirá o seu.
9 comentários:
Prof. Tabajara,
Gosto tanto qdo recebo seus emails que resolvi me manifestar. Não pense em deixar de enviá-los. Como vc mesmo disse, quem lê tanta notícia? Quem gosta de receber suas msgs. Vivemos neste mundo com tantas informações mas, as que vc envia, por vezes, servem para nos alertar de alguma coisa. Adorei esse último texto sobre A chave da gaiola. Lindo e claro, reflete a realidade. Abs.
Professor, muito pertinente esta "Chave da gaiola". É o que eu costumo entender como estigma, que vai dos mais inocentes como, por exemplo, "tu engordastes um pouquinho", até aqueles clássicos pejorativos "só podia ser coisa de um (a)..." geralmente atributos ligados à sexualidade ou etnia.Todos nós possuímos um potencial de resposta a estas situações que diminuem o eu e a auto-estima.A chave da gaiola está dentro de cada um de nós. Extremamente interessante o seu texto. Pode avisar sempre viu? Abraços.
Dá-lhe Tabá!
Mandando ou não, vou continuar lendo. Questão de escolha.
Outra coisa: a vida é cheia de gaiolas...
as da educação, por exemplo: matemáticas, físicas, literaturas...cada uma na sua...gaiola.
Abraço!
Tabajara,
não sei se lembrará de mim, mas acredite, fui seu aluno em algum momentos entre 1994 e 1999.
Apesar de acessar o "Blog do Taba" menos do que gostaria, sempre leio seus e-mails. Além de ser seu fã, faço isso porque, de algum modo, me permitem estabelecer alguns diálogos contigo - bendita esquizofrenia!!!
Além de tal comportamento sempre me trazer novos olhares a respeito daqueles velhos problemas, me permitem voltar a época em que cursava Oceano e as conversas contigo eram, no mínimo, esclarecedoras... Sendo sincero, de algum modo, acho que ainda continuam sendo!
Se você esta querendo parar de enviá-los é porque deve haver alguma forte "razão lógico-emocional". Como "amigo imaginário", eu entendo, mas não se "iluda", seus e-mais tem uma função. De alguma maneira, chegam àquelos tipos (onde me incluo) que você não se cansava de mencionar em suas aulas.
Um forte e saudoso abraço!
Flávio
É, o trampolim é a auto-imagem -advinda dos que nos cercam. Mas o "selvagem" é transformar tanto mensagens afetivas (cuidadosas) quanto opressivas em transmutação.
Gde abraço, Tabá.
Teu blog faz parte dos meus finais de semana.
Tabá, esta anônima aí de cima sou eu: Sandra Ribes
Tabajara,
Tanto o texto "Chave de Gaiola" como show da Adriana estão ótimos.
Bom fim de semana.
Abraço
Tabajara,
Tanto o texto "Chave" como o show da Adriana estão ótimos.
Bom domingo ao casal.
Como o primeiro comentário não aparecia, repeti e agora são dois.
Pareço minha tia Edith, que repete suas histórias num intervalo de cinco minutos. A diferença está na idade : ela tem 94 anos.
Mais um abraço, que sempre faz bem.
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