Reencarnação

Yo no creo en brujas, pero que las hay las hay

Ditado espanhol

Disse e repito: considero todas as hipóteses passíveis de comprovação, por mais atrativas e convenientes que sejam para nós. Se provadas, passo a acreditar, até que sejam desmentidas. Se não comprovadas, duvido. Se não posso comprovar ao contrário, admito a possibilidade de serem verdadeiras. Só. Sou cético.

No entanto, quando se vai aproximando da terceira idade, começa-se logo a pensar em reencarnação. É melhor fazer planos para o caso de uma possível comprovação futura.

Planos para a reencarnação:

a) Aprender a dançar torto, diferente, desengonçado, criativo, com um chapéu ridículo na cabeça. Como Tom Waits no clipe “Downtown Train”.

b) Ter cabelos lisos, volumosos e sedosos. Cantar rock com harmonias vocais fantásticas. Aprender piano desde menino. Compor melodias imbatíveis. Como os Beatles em todos os álbuns de carreira.

c) Começar a fazer teatro mais cedo e encenar peças marcantes e revolucionárias. Ser um ator com dignidade, mesmo em papéis caça-níqueis, que eu farei apenas para pagar as minhas despesas. Como Marcelo Mastroianni, nos filmes em que atuou.

d) Iniciar desde cedo a aprender a nadar, fazer ginástica, comer moderadamente. E descobrir o vinho antes da cerveja. Provar com freqüência os vinhos italianos. Como o Brunelo de Montalcino.

e) Viajar bastante. Conhecer todos os países possíveis e escolher um para ter uma casa alternativa, de preferência numa cidade pacata, nem muito bucólica, nem urbana em demasia, com um povo alegre e humano, solidário sem ser enxerido. Como Dublin, na Irlanda.

f) Descobrir mais cedo os segredos da docência, evitando massacrar os estudantes com insegurança e abuso de poder. Ter uma relação tão boa com eles que todos se tornarão competentes no que estudarmos juntos. Como ensina William Glasser.

g) Aprender a escrever desde cedo, com expressão, criatividade, bom humor, utilizando bem as palavras, com sensibilidade de poeta, apesar de escrever prosa, produzindo uma literatura ao mesmo tempo local e universal. Como João Ubaldo.

h) Escrever um livro que mude, para melhor, a vida de quem o ler. Um livro definitivo, marcante, mas simples. Como "O Apanhador no Campo de Centeio" do Salinger.

i) Compor melodias tão maravilhosas que toquem o coração das pessoas e as façam melhores e mais felizes, pelo menos por uns momentos. Como W. A. Mozart.

j) Descobrir meus amigos do peito de novo. Descobrir em que corpo eles foram parar. Chegar de surpresa, com uma nova fachada e dizer quem sou. Daí, será voltarmos a ouvir música, falar de rock, cinema e da vida. Como fazemos agora.

k) Ir buscar a Cleuza onde quer que ela esteja e propor casamento de novo, ajoelhado. Com um olhar de Anthony Hopkins em “Vestígios do Dia”.