

Os rosebuds aparecem nas formas mais estranhas, como a primeira bicicleta, ainda tentando aprender a não cair – emprestada do vizinho conhecido, porque para a família ter bicicleta seria um luxo.
Às vezes é o gosto do primeiro chiclete, novidade recém chegada ao Brasil na venda da esquina e que tinha um gosto extraordinário para as papilas virgens de um gurizinho. Anos mais tarde o gosto reaparece sob forma de um chiclete freshmint – era esse o gosto! – que oferecido à companheira merece o desairoso comentário: “Tem gosto de Gelol...” – era isso mesmo, era o gosto de Gelol que o guri procurava.
Houve rosebuds nas matinês de domingo no Cine Capitólio, com as chanchadas da Atlântida (comédias musicais brasileiras, ingênuas e descompromissadas, de baixo
orçamento, imitando as comédia de Hollywood), o Oscarito e o Grande Otelo, a beleza da Eliana, o Zé Trindade, com bigodinho salafrário, as músicas de Emilinha Borba – minha favorita em contrapartida com a Marlene.
As histórias precursoras de quadrinhos de “Juca e Chico” – ainda tenho em casa, sem capa.
Os livros das Aventuras de Xisto – fascinantes.
As aventuras de Arsène Lupin, ladrão de casaca, elegante, sarcástico e irônico, como criado por um bom francês, Maurice Leblanc. Os livros de Tarzan, de Edgar Rice
Burroughs. Eles me faziam companhia, levavam-me para viajar, numa época sem televisão e em que a Internet não era nem concebida em ficção.
Importantíssima a criação de uma biblioteca setorial na rua onde morava, que me permitiu acesso aos livros maravilhosos de Monteiro Lobato, onde aprendi mitologia grega e me diverti para valer. Na verdade era a biblioteca do pai do Mário Vieira, cujo tino comercial fazia-o alugar os livros para os vizinhos. Bendito tino.
Existem rosebuds que, encontrados, decepcionam tanto que seria melhor que nunca tivéssemos os encontrado novamente. Envelheceram. Foram falseados pelo tempo e pela memória ávida de emoções verdadeiras.
Mas existem rosebuds-reis. Há um álbum de história em quadrinho que li e desapareceu da minha vida: “Os Dois Mosqueteiros”, onde havia um casal de irmãos adolescentes e um troglodita que era viciado em licor de anis. A tinta do desenho era azul. Esse é o meu rosebud principal, que busco incessantemente, na Internet, nas feiras de gibis. No final da minha vida, já caduco, vou balbuciar para as pessoas: dois mosqueteiros, dois mosqueteiros... e elas vão usar isso como desculpa para justificar meu internamento num asilo geriátrico...
Acho que todos nós temos nossos rosebuds. Pedaços de infância e juventude, que, quando nos lembramos fazem nosso coração palpitar de emoção e os olhos encherem-se de lágrimas – em busca do tempo perdido. Talvez uma vontade de ser ingênuo e puro de novo, de se sentir seguro de novo, de saber-se sem preocupações e obrigações de novo. Vontade de voltar ao jardim do éden do útero materno.
15 comentários:
Rosebuds...muito bom...gostei muito. Passou um curta-metragem na minha mente...saudades...saudades e mais saudades!
A ânsia dos jovens os leva a atropelar o presente para chegar mais que rapidamente ao futuro, no entanto não é preciso chegar muito longe para ter saudades do bom e velho passado: pq sempre os "bons tempos" não voltam mais. Os rosebuds alimentam esta vontade de retorno no tempo.
Lindo texto Tabajara, fiquei com uma saudade da infância...
Jóia o texto. Oportuno.
Essa palavra é muito boa. Aparentemente, não temos um equivalente em Português. Aliás, quem encontrá-lo, avise.
No meu juízo, é necessário e urgente encontrarmos o nosso equivalente. Antigas superstições e novas teorias defendem que as coisas existem mesmo depois de nomeadas. Com a palavra, as pessoas vão esquecer menos seus rosebuds.
(Mais um) ótimo texto do Tabajara!
Quanto a um possível equivalente à palavra Rosebud em português, talvez seja melhor mesmo que não exista, pois assim não corremos o risco de traduzirem-na por algo parecido a "Rosabella", como fizeram os italianos ...
Oi Taba, adorei.
Eu estou sempre revivendo por pensamento os meus "Rosebuds"...
Pra mim as lembranças mais gostosas sao dos fins-de-semana na casa de meus pais. Meu irmao mais velho sempre colocava o disco de uma "banda nova", os Paralamas e o entao chamado "Rei do Rock", Raul Seixas. Meu irmao colova sempre estes dois discos.
Sempre que escuto essas musicas, gostando ou nao de Paralamas ou Raul, meu coraçao coracao palpita e suspira.
beijo Taba!
Engraçado, a busca de avançar, muitas vezes, coloca uma sombra no passado. É bom de vez em quando, refrescar a memória, como em um dia de verão, com a gelada água da lembrança.
Carlos
Fala, grande e venerável Taba!
Partilhamos alguns rosebuds - Amigos da Rosa?!?!
Bicicleta (quem não?), Sitio do Pica Pau Amarelo>> mitologia grega!
Àrsene Lupin que ainda tenho alguns, Tarzam do Burroughs, mas também do Príncipe Valente, cultura medieval.
Os impágavéis Juca e Xico, modelos de molecagem e astúcia infantil. Quebraram o paradigma da criança boazinha, cordata e "bem comportada que, convenhamos, conceito antagônicos* à alegria genuina.
Tudo de quase tudo, um pouco de nada e nada a ver, independente de ordem...
Minduim
*penso em uma anta agonizando, com a perninhas tremeluzentes pra cima e uma cruz no lugar do olho!
Maravilhoso artigo !
De tempos em tempos todos nos recordamos de fatos passados que muito nos marcaram. Mas eu nunca havia me lembrado antes do Arsène Lupin. Graças ao teu artigo, lembrei-me claramente o quanto apreciei os livros sobre o "ladrão de casaca" (sou mesmo daquela época...).
Um abraço
Theodoro
Dois rosebuds que recordo,
o albúm de figurinhas Bem-me-quer, que eu completei todinho, 100 figurinhas ao todo, e um dia resolvi recortar as bonequinhas e os desenhos e resultado destruí completamente!
Outra coisa maravilhosa de criança as revistas com bonecas de papel, essas sim deveriam ser recortadas e a gente podia trocar as roupas,sapatos, cabelos e acessórios! Tudo de papel, um máximo.
Pois é... Lembrei do gosto silvestre das frutas que comia, pendurada de cabeça para baixo, nas árvores de ameixa, aritcum, cáqui...
bêjo prá tú!
zél
A complexidade do hoje torna os
"rosebuds" vitais. Quanto de vida, sentimentos, significados nos recortes da memória! Vieram tantos... que silenciar parece a única forma de reverenciá-los(...)
O filme: ``MOTORISTA SEM LIMITES``.
Atores: Teixeirinha, Mari Teresinha, Jimy Pipiolo, etc.
Anos mais tarde (muitos anos mais tarde), numa pelada na AABB em Porto Alegre. Inicia o jogo e estou na zaga marcando um adversario. Quem era o cara? Jimy Pipiolo (o que sobrou dele). So eu tenho a dimensao do que senti naquele momento.
Isto eh Rosebuds??
Explicando o anonimato:
Taba... fiquei tão nostálgica que nem me identifiquei ao escrever hoje, às 13:28. O jantar de sábado se somará aos "meus rosebuds"... grande abraço!
Obrigado pelas contribuições de outros "rosebuds".
Jimy Pipiolo, apesar de feio como a necessidade, pode ser também um...
Puxa vida, Tabajara!!
Que coisa legal o tema apresentado neste post!!
Sabe que eu devo ter vários Rosebuds. Até porque sou, de uma natureza extremamente nostálgica.
Tenho impressão que um bom Rosebud é, contraditóriamente, aquele que não conseguimos alcançar ou então, alcançar por um esforço desumano.
O interessante é que li este teu post exatamente num momento em que estava com minhas lembranças voando por aí, exatamente em busca do que agora sei, era algum "Rosebud imaginário".
Sendo assim, muito obrigado pelo texto. :-))
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