quinta-feira, junho 08, 2006

Historietas (1)

Historieta 01: Foi por influência de um grande cientista alemão, Konrad Lorenz, fundador da investigação comparativa de comportamento, pai da Etologia (estudo do comportamento animal), através de um livro chamado “Falava com as bestas, as aves e os peixes”, que me foi presenteado pelo colega Joaber da Universidade, que comecei a falar com os bichos. Não falar como se fossem bestas. Falar como falo com qualquer pessoa. Quando me dirijo a um cachorro não costumo fazer aquela voz infantil que ouço freqüentemente os outros fazerem. Saúdo-os como adultos e seres capazes de compreender. Sei de gente que conversa a sério com as plantas e afirmam que elas se desenvolvem e crescem viçosamente. Quem quiser achar que é loucura ou efeito de aposentadoria e quiser contestar, pode, mas antes tem que fazer a experiência. Não acredito em nada que não possam me provar e não desacredito em nada que eu não possa provar ao contrário. Quando duvido, experimento.

Foi assim, com essa maneira, que cheguei um dia na casa de uma amiga e ela me disse que a gata de estimação do irmão, que estava passando uns dias com ela enquanto ele viajava, tinha escapado pela sacada daquele alto do edifício e se refugiado na sacada do vizinho do lado. Não queria voltar. Minha amiga não estava muito feliz com a gata soltando pêlos pelos móveis e o bicho tinha percebido, certamente. Eu falei que iria tentar convencê-la a voltar. Cheguei na sacada e, em princípio, não entendi como o bicho tinha feito para estar onde estava. Depois percebi uma pequena saliência na parede e conclui que ela tinha feito uma proeza, inconsciente da altura em que estava (fez porque não sabia que era impossível). Foi então que falei com ela, como se estivéssemos num colóquio entre vizinhos: “E aí, garota, como estão as coisas por aí? Passeando?”, debruçando-me sobre o parapeito. E ela me olhava intrigada, com cara de “esse cara é mais louco do que eu”, virando a cabeça daquele jeito que os gatos fazem quando estão curiosos. Falei: “Não queres vir para cá com a gente? Vem, vamos bater um papo!”, fazendo um gesto com a mão. Acho que o tom de voz e os gestos foram tão convincentes que ela rapidamente deslocou-se sobre a pequena saliência da parede e miou aos meus pés, virando a cabeça para cima. Missão cumprida.

Historieta 02: Se Milton Nascimento tem sua Paula e Bebeto (eles se amam é pra vida inteira - à vera) eu tenho meus Paulo e Giovana. Foram meus estudantes. Ele num ano obteve nota dez em todos os trabalhos que fez e ela, no ano seguinte, obteve nota dez em todos os trabalhos que fez. As provas dos dois eram de dar inveja ao professor. Como Salieri examinando as partituras do Mozart, eu pensava que eu queria ter escrito aquilo se eu fosse estudante. Ambos são tímidos e modestos, apresso-me em contar, uma vez que a vaidade e arrogância seriam até explicáveis no caso deles. A turma do Paulo me convidou para paraninfo. Fiz um discurso emocionado, que Giovana estava filmando e, quase estragou a filmagem, pois chorava enquanto filmava.


Quando resolveram casar, convidaram Cleuza e eu para padrinhos de casamento. Fomos para Caxias, nos arrumamos num hotel e fomos para a igreja. Estávamos todos lá, padrinhos, no altar e o Paulo esperando, nervoso. A igreja cheia. Eis que chega a noiva, linda, com seu olhar penetrante e brilhante. Eles se olham e desandam a chorar, os dois, Paulo mais ainda, não se contém, nem faz questão. A mãe do Paulo não ensinou para ele que homem não chora. Ainda bem. Naquele momento eles espalharam emoção no mundo. As pessoas que estavam ali aprenderam algo muito importante.

Na festa do casamento passaram o microfone, para que os convidados dissessem algumas palavras para os noivos. O pai da Giovana me exortou à moderação, pois na formatura tinha se emocionado com o meu discurso. Comecei a falar sobre os dois, mas como não ser emocional tratando-se deles? Mais tarde soube que a avó da Giovana tinha ido para o hospital durante a festa. Fiquei me sentindo culpado. Mas, era vaidade minha, ela passara mal por problemas pessoais.

Eles se amam e é pra vida inteira, de verdade.

Até hoje, quando nos encontramos, trocamos muita energia positiva, muito amor velado, sem palavras - não são necessárias.

A gente se ama e é pra vida inteira, de verdade, como amigos do peito.

11 comentários:

Anônimo disse...

Pôxa, Tabá, bom saber das tuas mil utilidades frente a problemas "pós-modernos": comunicação com bichos e comunicação enquanto bichos na relação (quanto de magia e quanto de realismo). Um "cheirinho" pra ti.

Anônimo disse...

Oi Taba, adorei as duas historias e nem sei qual gostei mais. A da gatinha malandra, fiquei te imaginando la, batendo um papo com a felina... ela logo sacou teu encanto e pluft, pulou para perto de ti. Gatos sao danados, amo os meus. As vezes fico até um pouco mal, pois parece que sinto mais falta deles aqui em Rimouski do que de pessoas. Talvez porque eu esteja rodeada de pessoas legais, mas sem meus gatos... Quanto a historia dos amados amantes, claro que fiquei com inveja dos comentarios sobre os dois alunos perfeitos, é mais forte do que eu... mas achei linda a historia e quero que eles sejam feliz para sempre.
um grande abraço da amiga grasi

Anônimo disse...

Oi Taba, adorei as duas histórias, hehehe
Na primeira consegui até imaginar os teus gestos e como falavas com a bichana... Tens um modo inconfundível de falar e visualizei toda cena na minha cabeça...
Quanto a segunda história, gostaria que minha primeira história de casamento tivesse dado certo (hahahah de casamento porque primeira história aí'são outros quinhentos....)Como não deu achava que felizes para sempre é coisa de gente antiga, que por preconceitos vivia junto até o fim mesmo que tudo se transformasse num tédio, hahahah Enfim: o que quero dizer é que hoje de repente esteja com a pessoa certa para dizer "e viveram felizes para sempre" mas também se nào for, basta eu saber que pelo menos eu tenho vivido e sido feliz com meus acertos e erros... o resto é detalhe! beijoooos

Karen Lose disse...

ai, ai...que lindas historietas!!! ótimo para ser lido numa sexta depois de 10 aulas dadas! Dá uma animada na alma!!!
Tenho que confessar que também falo com os bichos e eles me fazem uma baita falta, porque morar em apto pequeno e ter bicho não é pra mim...tenho pena deles e de mim! Mas sinto uma falta enorme do carinho do meu cão e das conversas que tínhamos..é isso mesmo, conversas! era um diálogo muito legal!!
Agora estou testando uma nova forma de comunicação...ando falando muito com as paredes!!! hehehe!!! Quando descobrir a reação delas eu te conto!! Um grande abraço, Karen.

Karen Lose disse...
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Anônimo disse...

Amigo Tabajara, lhe conheço a pouco tempo, mas posso te revelar oque realmente me identifico na tua personalidade, sem dúvida oque te faz um super ser humano repleto de sensibilidade é sua INQUIETUDE, eis a grande vontade de fazer coisas novas, supreender, e se supreender, li suas historietas e as achei muito reais ao meu mundo, simples, mas com ternura aflorada, logo me prendi no texto da conversa com os animais, pois á pouco tempo comentava a virada da temperatura com a minha cadela, um abraço!

Anônimo disse...

Gosto muito desses historias. Eu e o meu namorado vamos casar em breve e somos ambos pessoas emocionantes. Ian e homem como esse Paulo, ele chora sem vergonha, sempre com emocao. Ele chora de felicidade quando a equipa dele ganha uma joga de futebol, e ele chora de lamento quando os animais ou as criancas morrem ou sofrem.

Anônimo disse...

Pues resulta que leyendo tus Historietas pensé, y ahora te lo digo, que debías escribir un libro, digo mejor, juntar lo que estás escribiendo, quién sabe si ampliando, completando, hasta entrando en recuerdos, vivencias más complejos e íntimas.
Algo sé del asunto, si bien en arte nunca el juicio es muy cierto. Como lectora siento que tus textos tienen una pulsación humana profunda. Y la tienen porque están muy bien escritos (dejo a un lado la persona extraordinaria que eres :) Captan un instante único de la memoria emocional e imaginativa, que memoria es invención también. Humor, poesía, figuras reales, sobre todo la del autor que no se esconde, crean una imagen generosa, pero no complaciente, de la vida, de una manera de estar en ella comprometida y actuante, sin consignas ni programas. Así tu escritura fluye en su movimiento rico y matizado, dejando destimonio de un estar y de un siendo.
Piensa en eso... eres un escritor natural (esos son los que de veras sirven porque tienen algo que decir y lo dicen sin falsos pudores).A la vez, los escritores se hacen escribiendo y en eso estás.
Te abraza y admira!
A.

Anônimo disse...

Oi professor, admiro pessoas que tenham dons para falar com gatos, acho um bicho muito independente e cheio de razão. Na verdade tenho é muito medo deles, me olham parece que vão me atacar a qualquer momento. Quanto a segunda estorieta estes são os bons resultados que a academia nos traz. Fazer bons amigos.

esperanca disse...

Grande Tabá!

Minha mãe fala com as plantas principalmente. Num dia reclamei que minhas violetas não davam mais flor e ela me disse sem perder o embalo: - vai ver é porque tu não conversa com elas.

Desde então, procuro uma aproximação.

Abraço.

Anônimo disse...

Oi Tabajara, nem sei o que dizer. Obrigada!