Defeitos e Virtudes

De novo uma reedição... Uma amiga incentivou-me a republicar, dizendo que era bom lembrar dos textos antigos e eu aproveitei o arsenal que tenho para encobrir uma total falta de inspiração... espero que momentânea...


Pensando bem, como separar o que é defeito e o que é virtude?

Fosse pelo senso comum, poderíamos fazer uma lista, tipo relatório contábil: de um lado o que é defeito, de outro o que é virtude, feito débito e crédito.

Mas será que é assim mesmo?

Será que dá para separar essas qualidades humanas como se fossem preto e branco?

Na minha opinião, não. Tenho observado que muita gente faz essa separação e acaba tendo problemas. Tenho encontrado pessoas que estão num dilema porque entraram numa situação em que devem violar, em princípio, o que consideram uma virtude, como lhes foi ensinado pelo senso comum.

Está lá na minha frente aquele meu amigo, muito cordato, gentil, educado, queixando-se que alguém abusou da sua paciência e lhe causou uma enorme decepção, colocando-o numa situação humilhante. Na conversa, percebo que o outro se aproveitou justamente de sua boa educação e gentileza para conseguir humilhá-lo. Como ele não queria violar seu princípio de gentileza de bom moço, que para ele é uma grande virtude, acabou caindo naquela situação em que o outro tirou vantagem. Pergunto-lhe porque ele não reagiu com a veemência necessária, denunciando o abusado, e ele responde que não tem essa capacidade. Não tem capacidade de fazer o escândalo que o outro temeria. Decorrente de onde essa incapacidade? De sua “virtude”.

Penso que as qualidades que classificamos de virtudes e defeitos, só devem ser classificadas assim em relação a uma determinada situação. Como a moldura de um quadro valoriza ou desvaloriza uma obra de arte, assim uma determinada situação valoriza ou desvaloriza uma capacidade e a enquadra como virtude ou defeito.

Ficar passivo diante de alguém arrogante, vaidoso, impostor, alegando gentileza e boa educação é virtude ou defeito?

Ser calmo, nunca gritar com alguém, não fazer escândalo e tomar tempo com prudência numa decisão é virtude ou defeito quando se trata de uma emergência?

Vaidade: é defeito? E se uma pessoa elimina toda sua vaidade pessoal, não elimina um pouco da auto-estima? Não acaba se desvalorizando demais?

Humildade: é virtude? Então pensemos em alguém que se submete aos desmandos de outro sem qualquer reação, sem determinar sua própria vontade e vejamos como estamos agora considerando o que chamamos inicialmente de virtude.

Um sujeito que taxamos de “exibido”, não pode ser o sujeito que invejamos pela desinibição que gostaríamos de ter?

É claro que acho que muitas afirmações provindas do senso comum são reais e verdadeiras. Sei muito bem que os extremados vaidosos, arrogantes, gritões, impacientes, donos da verdade, impostores são pessoas insuportáveis de se conviver. Sei também que as pessoas calmas, pacientes, humildes são aquelas com quem preferimos estar. O que estou tentando ponderar é que as qualidades em julgamento devem ser relativizadas e amenizadas.

O que procuramos realmente são pessoas com equilíbrio entre as virtudes e defeitos, que saibam dosar pitadas de cada uma dessas qualidades humanas, sem exagerar nos matizes ou temperos. E as saibam utilizar nos momentos adequados.

Não é aquele sujeito escandaloso e gritão que faz falta num incêndio?

Para uma imagem visual, o bom seria referir-me ao símbolo do Yin-Yang.