sexta-feira, abril 13, 2007

Dos direitos naturais dos calvos

Quais os direitos dos oprimidos?

Terão os oprimidos direitos de reação sobre todas as outras pessoas, quer sejam diretamente ou não seus opressores?

Cena 1: O rapaz, numa cadeira de rodas adaptada para esporte, circula em alta velocidade pela pista pública de corridas no Menino Deus. Ele grita para saírem da frente e joga todos os corredores que encontra pela frente para fora da pista. Ele não tem controle técnico sobre o equipamento, não pode desviar, não tem buzina. Por pouco não machucou uma moça. Mas o rapaz, lembrando-se do pouco caso das autoridades com pessoas como ele, acha natural, perdoa-se e não se desculpa.

Cena 2: O rapaz afro-descendente passa com seu carro pelo sinal vermelho. Um pedestre, sobre a faixa de segurança, reclama e ele, lembrando-se dos anos de opressão de seus antepassados, acha natural dizer que a reclamação é racista.

Cena 3: Uma moça loira classe média alta, cabelos lisos e, suponho, perfumados, como costumam ser, na saída da escola do Júnior, irritada, força a passagem pela direita do outro veículo. O motorista reclama e ela grita, lembrando-se dos anos em que a mulher é oprimida pela sociedade chauvinista, considerando natural: “Seu machista, fdp!”.

Cena 4: O motoboy que faz entrega de água, sai na contramão com sua motocicleta rua afora. Um pedestre reclama do susto que levou ao atravessar a rua, olhando para o lado correto e o motoboy responde, achando natural, lembrando-se de todos os anos em que a classe trabalhadora é explorada: “Tô trabalhando, velho babaca!” (não – não era eu...).

Cena 5: O homossexual ocupa o banheiro da casa do amigo por 2 horas contínuas. Quando a mãe do amigo reclama, ele diz, achando natural, que ela é preconceituosa, lembrando-se de todos os anos em que esta opção sexual é reprimida socialmente.

Cena 6: O rapaz judeu torra a paciência dos amigos com críticas constantes e reclamações impróprias, nunca os elogia ou acarinha. Quando reclamam, ele, lembrando do Holocausto, achando natural, alega anti-semitismo.

Cena 7: A jovem verticalmente prejudicada empurra uma pessoa que pacientemente aguarda num guichê. A pessoa fica chocada e não sabe o que fazer. A jovem, lembrando de todos os anos em que as pessoas de baixa estatura são discriminadas, achando natural, reclama: “Quié, vais querer que eu ainda peça licença?”.

Cena 8: O jovem morbidamente obeso senta-se no ônibus e quase ocupa os dois lugares. A chegada do companheiro de viagem causa-lhe incômodo e ele, lembrando-se do descaso que pessoas de seu peso sofrem na sociedade, passa a reclamar da presença da pessoa ao lado – em voz alta, achando natural.

Dado que há um inegável histórico de pouco caso e opressão com as pessoas de pouco cabelo, reivindico o
meu natural direito de careca oprimido:

a) Que passe a ser adotada a denominação politicamente correta de “charmoso indivíduo capilarmente prejudicado” para os calvos.
b) Abolição das referências: pouca-telha; aeroporto de mosquito; bola de bilhar, quereca, entre outras.
c) Pena de prisão inafiançável para quem dirigir palavras ofensivas (sobretudo quereca) referentes à minguada capilaridade do ofendido, com direito deste de cuspir na cara dos detratores quando assim lhe aprouver.
d) Desconto de 20 % em restaurantes e 50% caso se tratar de restaurante tailandês.
e) Vinho tinto de cortesia ao pedir qualquer tipo de refeição.
f) Entrada com desconto de 50% em shows musicais.
g) Livros ao preço de custo em qualquer livraria.
h) Prioridade nas filas de cinema, casas de CDs, teatros e supermercados. A lista fica em aberto para acréscimos necessários.
i) Direito de entrar em sua garagem a qualquer hora do dia sem lhe obstruírem a passagem.
j) Direito de andar de bicicleta em alta velocidade por cima da calçada. Caso alguém seja atropelado, este deverá pagar o conserto da bicicleta.
k) Direito de estacionar o carro em qualquer lugar, mesmo em frente às garagens dos edifícios.
l) Cirurgia gratuita de meniscos.
m) Fornecimento de perucas, produtos capilares (incluindo o tradicional cocô de galinha) por parte do Estado, sem que o reivindicante tenha que ingressar em filas de espera.
n) Protetor solar gratuito em qualquer farmácia.
o) Casos omissos serão resolvidos pelo próprio interessado.

Natural, não?

15 comentários:

Tabá disse...

A ministra brasileira da Integração Racial (!) disse que achava natural que, no Brasil, os afro-descendentes reagissem mal aos brancos. Luiz Fernando Veríssimo apoiou e explicou. Na França um dos candidatos à presidência disse que entendia os pedófilos.

Eu já disse que entendo os serial-killers.

O texto que escrevi é para distinguir compreensão de aceitação. Quero todos os comprovados assassinos, pedófilos, atropeladores e outros, punidos. Compreendo, mas não aceito.

Também acredito que haja tanto mau-caráter entre os carecas quanto no resto da humanidade. Puro pensamento estatístico.

Anônimo disse...

Os barbeiros certamente deveriam dar um bom desconto. Cortar cabelo de calvo deve ser uma barbada (perdão, não resisti... hehe).

Tabá disse...

Barbeiro?!? Que diabo é isso??

Anônimo disse...

Lendo seu post, ocorreu-me que, do jeito que veleja, a nau dos insensatos acaba pondo a culpa por todas as opressões nas costas largas do único sujeito que não tem ong que promova o resgate de seus dereitos, isto é, aquele assumidamente homem, heterossexual, católico, pobre, branco e com cabelo. Quem preencher os requisitos, que se habilite. Será condenado à pena máxima por crime hediondo, contra o resto da espécie ...

Jaque Machado disse...

Este gole de sarcasmo desce melhor uma bela garrafa de vimho português!

minduim disse...

Mais um artigo:
Readequer o flash da máquinas digitais, que provocam um brilho excessivo e denunciador.
Valeu grande Taba

Anônimo disse...

Com o humor de sempre, abordas um grande dilema ético. Também tenho a tendência a compreender os motivos históricos que levam os oprimidos à resistência (inclusive os carecas), algumas vezes transformada em ódio, agressividade, revolta, mesquinharia... formas difíceis de acolher... numa complexidade latente que revela a banalização do que vem a ser direito, dever, o que é próprio "do privado" e/ou "do coletivo". Será que algum dia faremos deste (não um outro) um mundo em que as diferenças sejam respeitadas de fato, com grandeza de alma, de humanidade? Esta intenção pelo menos pode guiar algumas trajetórias, né?
Particularmente acho alguns carecas bem charmosos, eheheh!!!
Bjão

Anônimo disse...

Taba

Um colega nosso da FURG entrou numa fila para idosos e deficientes num grande supermercado. Tipo perfeitamente normal e com bem menos de 60 anos. Por outro lado era o proprio escorregador de mosquitos (perdao!!!, a lei já está em vigor?). Quando questionado sobre o problema que teria disse que era deficiente capilar. Gerou risadas e passou no caixa.

Achei legal que nao pedistes cotas em universidades e nem pensões por causa das lutas travadas contra a repressao aos sem cabelos. Isto aumenta a minha admiração por essa classe da qual já considero que tenho uns 70% de participação.

Por outro lado, discordo totalmente da distribuição de perucas. Nao confio em quem usa esse troço (perdão Elton John)!!. Pediria a inclusão do implante capilar no nosso espetacular SUS e nos nossos não menos espetaculares e sempre honestos planos de saúde.

Saudações capilares

Osmar

PS. Luis Fernando Veríssimo já morreu e ainda não foi avisado. Faz muito tempo que não dá uma dentro nem como escritor ( a fórmula é sempre a mesma) e nem como cronista já que é totalmente cego em sua parcialidade política.

Fernando disse...

Taba, deixe pegar carona e dizer: Boa Osmar.

Anônimo disse...

Tabá, peço também tua licença para, rapidinho, expor uma dúvida que me surgiu ao ler o texto do Osmar, endossado pelo Fernando.

Será que podemos usar a parcialidade do L.F.V. para decretar sua morte como cronista e escritor? Ou, então, a sua fórmula de escrever?

Quanto à fórmula, há tanta gente boa fazendo mais do mesmo por aí; o LFV é só mais um e, diga-se de passagem, com razoável sucesso. Há cantores que repetem praticamente o mesmo show por vinte anos a fio! E ai desses se não o fizerem! O seu público assim o exige. Exemplos marcantes são Belchior e a dupla Sá e Guarabira. Em verdade poucos conseguem se renovar constantemente, correndo todos os riscos que advém desta metamorfose ambulante - Caetano Veloso é um desses raros exemplos.

Já com relação à sua famosa parcialidade, quando se afirma que ela o cega e, portanto, o incapacita como escritor e cronista, fico a pensar no que me ensinava o saudoso mestre Ricardo Timm, quando assistia eu suas aulas de filosofia aqui na Furg, alguns anos atrás. Dizia ele que essa idéia de que há uma verdade a ser alcançada era a mãe da maiorira das guerras (inclusive as individuais) e que nós ainda somos muito positivistas (e cartesianos), mais do que imaginamos. Dizia também que não há meio de querer reduzir a nossa imensa diversidade a um único modo, um único sistema, um único qualquer coisa, toda tentativa de se alcançar a totalidade historicamente redundou em totalitarismo. Sendo assim nos restaria perceber que exatamente essa enorme diversidade é que nos faz ricos e que perdemos muito ao tentar submeter todos a um único modo de pensar.

Então, se somos todos diferentes, cada qual com seu modo de pensar, com suas muitas e distintas experiências e influências ao longo da vida, será que dá para alguém se imaginar imparcial quando se debruça sobre qualquer coisa?

Falando por mim, tendo a acreditar que, por tudo isso, a imparcialidade é uma miragem. A gente pode até tentar mas desconfio que no mais das vezes a emenda pode ficar pior que o soneto, ou seja, ao fazer um esforço pela imparcialidade podemos deixar de perceber que continuamos parciais, e daí é um passo para decretarmos que nosso veredicto é o correto, a verdade, afinal estamos sendo imparciais. Pior, ainda vemos qualquer outra opinião contrária à nossa como parcial pois, se quem a disse tivesse sido imparcial só poderia chegar à mesma conclusão nossa, a verdade. Se tal não se dá é porque ele tem algum interesse, é parcial, portanto.

Uma das áreas mais interessantes para se observar fenômenos relacionados a este tema é, sem dúvida, a área da mídia. Hoje praticamente todos os noticiários, escritos, falados, digitais..., se apresentam como totalmente imparciais. O que eles fazem? "Escolhem", dentre as várias versões (e sempre as há) de um fato e a apresentam como a verdade, inquestionável, portanto (isso para não falar da própria seleção do que é noticiado e do que não é). Creio eu ser muito mais honesto, muito mais imparcial, apresentar todas as versões disponíveis, deixando ao leitor/ouvinte/expectador ..., a tarefa de, com sua consciência, construir a sua idéia sobre o assunto. No entanto, o que se vê hoje de forma crescente é o modelo de noticiário com âncora, aquela pessoa encarregada de, após a apresentação do fato "selecionado", pensar por nós e dar forma acabada à versão que está sendo apresentada como expressão da realidade.

Isso já é complicado quando os que assim agem pensam estar fazendo o certo, ou seja, eles acreditam que estão agindo "corretamente", à serviço da "verdade" e, por isso, imparcialmente, escolheram aquela versão que "eles" acreditam ser a verdadeira (será que, dada a nossa diversidade, alguém não poderia pensar diferente, não teria este direito?). Imaginem agora quando o reponsável resolve "dar uma mãozinha" para que a versão que lhe interessa, que lhe é mais favorável, seja aquela apresentada como a verdadeira. Daí todo o poder da mídia atual.

Mas isso já é uma outra conversa. Só queria mesmo era dizer que acho o LFV muito honesto quando ele deixa claro a sua imparcialidade para todos que o lêem. Bem pior, no meu modo de pensar, são os que tentam aparentar neutralidade, usando-se disso, inclusive, para reforçar seus argumentos na disputa pela versão correta.

São só algumas idéias, mas se alguém ousar discordar delas eu prendo e arrebento ...
(brincadeirinha, claro...)

Abraços, Tabá, Osmar e demais leitores.

Eduardo (Duda) Carvalho Pereira

Anônimo disse...

Taba

Usando um jargão de assembléia de sindicato, já que fui citado pelo Duda, venho solcitar o direito a resposta.

Duda, sem dúvida que concordo com muita coisa que escrevestes. O caso da mesma fórmula vale para todo o mundo. Quando cantore(a)s que eu gosto começam a se repetir, paro de comprar os discos. Fiz isso não só com Belchior e Sá e Guarabira, mas com muitos outro(a)s. Faz tempo que o LFV se tornou óbvio demais. Eu gostava dele. Lembro de textos geniais e ainda uso em minhas aulas uma tira das Cobras. Através desses personagens LFV critica a fórmula como pesquisadores explicam seus achados, num complicado cientifiquês que ninguem entende, só eles. Mas fiz com ele o que fiz com outros. Reconheço o passado e deixo de lado no presente.

Também não acredito na imparcialidade da imprensa. E não é só a brasileira. em todo o mundo isso está nas mãos de grupos poderosos. Mas as vezes eu espero que os caras que podem ser independentes pois são cronistas, bem (in)formados, saiam de suas conchas ideológicas e discutam o que o resto é impedido por forças das linhas editoriais. Já vi LFV defender o indefensável e esse caso da Ministra da (des)Integração racial é emblemático. Essa política absurda com relação aos ditos problemas raciais está fazendo aumentar o racismo. Estão colocando as coisas como diferenças de cores. Não nego o racismo, mas o preconceito entre classes sociais, independente de cor é muito maior. E este é um grave problema. O Ministério deveria ser de Integração Social.
Abraços e vivam os pontos de vista diferentes.
Osmar

Anônimo disse...

É interessante como se aproveitam quaisquer "ganchos" para criticar políticos e se colocar acima de qualquer suspeita. A frase "esse país nada nos oferece" é bandeira para todos que que estão de prontidão para reclamar de tudo como se tudo devesse vir do estado.

Este cidadão comum ( eu ), um "João-Ninguém" empresarialmente falando, professor da rede pública estadual ( há quem pense que sou da universidade ... ) inventou de promover um tal projeto Conexão Jazz, que sem um centavo do estado, em suas três instâncias, sem patrocínio, e sem dinheiro no próprio bolso para cobrir qualquer prejuízo, está trazendo a Rio grande, fim-de-mundo com certeza ( pelo menos do ponto-de-vista geográfico ) músicos de jazz da Europa e dos Estados Unidos, e cobrando R$ 15,00 o ingresso ( direito à cultura por preços baixos ). O último aconteceu no dia 14 de abril, o 7° show internacional, com um guitarrista sueco e, num teatro com 400 lugares, havia 160 pessoas.

Eu pensava que, fazendo isso, estaria contribuindo, entre outras coisas, para subverter a lógica interiorana antiga de viajar para a capital para ver espetáculos de alto nível. Errei. Hoje eu percebo que as pessoas têm prazer em fazer isso, não importa a que preço ($).Talvez até eu deva aumentar o preço do ingresso para tornar o evento atrativo.

Reivindicar direitos é uma barbada, principalmente por quem não tem tanta necessidade deles, raro é aproveitar o direito que é suprido e reconhecer que ele existe.

Vou parar de tentar compreender esse comportamento porque isso pode me levar à calvície. UFA !!! Consegui criar um gancho para justificar minha interferência neste texto do Tabá.

Na verdade eu queria era interferir nos três últimos.

CELMER

Tabá disse...

Vocês que são cabeludos que se entendam...

Celmer: lamento não poder ir aos teus shows. No entanto, acho que deves continuar insistindo e acreditando.

Anônimo disse...

Tabá
Só agora ví o último comentário do teu blog a respeito dos carecas. Como não preciso procurar ganchos para escrever, entro direto no assunto que quero.
Fico pensando sobre quem verdadeiramente assinou o último comentário. Não acredito que tenha sido um cara como o Celmer, ou pelo menos o que eu penso conhecer. Pela arrogância (apesar de se dizer um joão ninguém) e agressividade, me parece um cara saído dos porões da ditadura. Ou agora é proibido criticar o(a) político(a) favorito(a) de alguém?? Ou então foi a Velhinha de Taubaté (obrigado LFV)que acredita em tudo o que diz a versão sempre imparcial dos porta-vozes do governo. Essa pessoa não deve acreditar em mensalões, deve acreditar que o filho do Lula ficou milionário por competência própria e que tudo vai bem nos ares do Brasil. Sinceramente, não entendi. Eu e o Duda podemos ter e diferenças de opiniões mas cada um respeita a do outro. Aqui, nesse caso, não vi isso. Ninguém tentou se colocar acima de qualquer suspeita (seja lá o que for isto) e não se espera tudo do governo. Só que ele seja honesto e cumpra a constituiçao. Que, estamos carecas de saber, num estado democrático, dá liberdade de opinião.

Osmar

Xanxa Symanah disse...

Tenho uma teoria: as pessoas com falta de cabelho sao totalmente loucas!!! (com as vacas ingleses!)

Da tua irma inglesa

Sarah Xanxa